Três poemas sobre o trabalho
Eu passei o dia inteiro
Eu passei um dia inteiro
pra fazer essa modinha,
você chega e vem dizer
que a modinha não é minha?
A modinha é minha, sim,
quem não sabe, vai saber,
não tem como duvidar,
vou provar por a mais b.
Veja só o jeito dela:
confusa, desajeitada,
coitada, destrambelhada,
capenga, desengonçada.
Basta olhar pra cara dela:
disforme, deselegante,
quadrada, mal-ajambrada,
mixórdia marca barbante.
Rima pobre, manquitola,
arremedo incompetente,
tentativa que não cola,
só amola, infelizmente.
Sem assunto, sem ideia,
banal, batida, bisonha,
lengalenga, logorréia
sem sentido, nem vergonha.
Tal bobice é um bagulho
é tolice atrapalhada,
é só burrada e barulho,
de poesia não tem nada.
Vou parando por aqui,
já chega de picuinha.
Quero ver quem vai dizer
que a modinha não é minha!
📝 Do livro “Ninguém sabe o que é um poema”, Ática, 2004.
Acende a luz
Acende a luz do seu discurso
E descomplica o seu dizer
Desata o nó que prende o rio
E deixa este barco correr
Tira da língua a trava e a tranca
Sete cabeças? Só se for bicho
Fala direto, não atravanca
Manda o prolixo pro lixo.
📝 Do livro “Ninguém sabe o que é um poema”, Ática, 2004.
Repensar a máquina
Repensar a máquina.
Desligar, desmontar, desfazer
engrenagem por engrenagem
parafuso por parafuso.
Separar as partes que funcionam.
Localizar as que não cumprem seu papel
(mas poderiam cumprir).
Inventar peças inexistentes e necessárias.
Extirpar as partes mortas
a podridão inútil
a necrose que envenena e ameaça.
Religar, remontar, refazer a máquina.
Engrenagem por engrenagem
parafuso por parafuso.
Repensar a máquina.
📝 Do livro “Caderno veloz de anotações, poemas e desenhos”, Melhoramentos, 2015.
🖼️ O desenho é do livro “Caderno veloz de anotações, poemas e desenhos”, Melhoramentos, 2015.
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