Coco Verde e Melancia
Uma das características mais extraordinárias dos contos populares, creio, é o fato de nunca apresentarem uma versão única, definitiva e final. Contados de boca em boca através dos séculos ou mesmo quando escritos, seus enredos de certa forma são recriados por cada contador de histórias, que acrescenta a eles as marcas de sua subjetividade, sua experiência de vida e de sua formação cultural. Trouxe aqui duas versões de um mesmo conto: a primeira escrevi baseado em pesquisadores e folhetos nordestinos. A segunda, é baseada em narrativa recolhida na região sul. O desenho, do livro “Cultura da Terra”, foi feito a partir desta versão.
Coco verde e melancia
(versão do livro “No meio da noite escura tem um pé de maravilha!”, Ática, 2001)
Era um fazendeiro muito rico. Dono de terras, usinas, gado e muitas plantações. O homem tinha também uma filha muito bonita.
A menina estudava na escola da cidade. Lá conheceu e começou a gostar de um colega de classe.
Onde um ia o outro estava. Onde um estava o outro ia.
Acontece que o menino era pobre. O fazendeiro soube da amizade da filha. Soube que um não largava o outro. Soube que os dois passavam o tempo todo juntos. O homem não gostou nem um pouco. Falou com o professor. Mandou a menina mudar para o período da tarde.
Assim, achava ele, os dois, sem se ver nem se encontrar, acabariam esquecendo aquele amor.
Mas a menina gostava muito do menino e o menino gostava muito da menina. Os dois fizeram um plano.
Num pé de serra, no caminho da escola, tinha um arvoredo. Seria ali o seu lugar secreto dos dois. O combinado era que sempre que um deles, voltando ou indo para escola, passasse por lá, deixaria uma carta escondida.
Para o caso de alguém descobrir as cartas inventaram dois apelidos.
O menino passou a ser Coco Verde
A menina passou a ser Melancia.
E assim , mesmo sem se ver, os dois, através de cartas, continuaram conversando, trocando idéias, comentando a vida, trocando sentimentos, cada um gostando cada vez mais e mais do outro.
O tempo passou.
Os dois namorados cresceram. No lugar de cartas, começaram a se encontrar escondidos debaixo do arvoredo para conversar e namorar.
Era tudo secreto. O pai de Melancia não podia saber de nada.
E cada vez que os dois se encontravam, que alegria. Passavam o tempo todo conversando e namorando e matando a saudade. Na despedida, juravam seu amor, juravam que um não ia viver nunca sem o outro.
– Amo você, Melancia!
– Amo você, Coco Verde!
– Mais que tudo, Melancia!
– Mais que tudo, Coco Verde!
Um dia, um amigo do fazendeiro, passando pela estrada, viu a moça e o moço abraçados debaixo do arvoredo.
O homem foi correndo avisar o fazendeiro.
Foi um Deus nos acuda. O fazendeiro ficou uma fera.
Quando a menina voltou para casa, o pai, sem avisar nem explicar coisa nenhuma, disse a ela que arrumasse as malas. Mandou a filha morar na casa de uma tia que vivia longe, do outro lado da montanha.
– Pensam que me enganam? dizia o fazendeiro fumando charuto.
Em seguida, mandou matar um bode, pegou um vestido da filha e encheu de sangue. Colocando o bode num caixão, mandou espalhar a notícia de que sua filha voltando da escola tinha sido atacada por uma onça e, infelizmente, tinha morrido.
Quando soube da notícia, o rapaz deu até risada.
– É mentira!
Mesmo assim foi correndo até a fazenda.
– Cadê a menina?
Encontrou o fazendeiro com um lenço na mão, fazendo cara de choro fingido.
– Tá tudo acabado! disse ele rindo por dentro. – Minha filha, minha jóia perfumosa, minha flor encantada morreu!
Mostrou o vestido da menina rasgado e cheio de sangue.
–Foi onça! explicou o fazendeiro chorando. – Não teve jeito!
O coração do rapaz parou de bater. Uma tontura veio que quase derruba ele no chão. Acompanhou o enterro em silêncio. Nem chorar, ele chorava. Só olhava o caixão. Imaginava que ali dentro estava o corpo da moça quando ali só tinha um bode velho morto.
Depois do enterro, o rapaz saiu andando. Sua vontade era morrer afogado na lagoa. Sua vontade era cair do alto do precipício. Resolveu passar no caminho onde, diziam, a moça tinha sido atacada.
– Quem sabe a onça não me mata também e assim eu vou pra onde ela foi?
E o moço ficou doente. Parou de falar. Parou de comer. Deitado na cama, só pensava na morte, mas morte não veio. Um dia, saltou da cama:
– Chega! Vou sair pelo mundo!, disse ele. – Vou tentar começar tudo de novo!
Despediu-se dos pais, pediu a benção e foi embora. Não conseguiria mais viver naquele lugar. Cada prédio, cada caminho, cada arvoredo, cada paisagem trazia em sua cabeça da imagem perfumosa, doce e suave de sua querida Melancia.
Durante três anos inteiros, o moço viajou pelo mundo. Conheceu novas terras, teve muitos empregos, acabou virando um negociante e conseguiu ganhar muito dinheiro.
Um dia, sentiu saudades de sua família. Pensou em sua mãe. Pensou em seu pai. Sentiu que precisava voltar.
– Volto para matar a saudade da família mas fico só por uns dias. Não quero ficar lembrando da minha querida! pensou ele com os olhos molhados.
Quando chegou, soube que a moça, a filha do fazendeiro, ia se casar.
– O quê? gritou o moço. – Casar como se ela morreu?
– Morreu nada! disseram as pessoas.
Só então, o moço ficou sabendo do truque do fazendeiro para afastar os dois.
Soube também que, depois de um ano na casa da tia, a moça voltou e seu pai mentiu de novo. Contou a ela que o moço tinha arranjado outra namorada, tinha casado e ido embora.
Quando soube disso, a moça também ficou doente. Também parou de falar. Também parou de comer. Deitada na cama, só pensava na morte, mas morte não veio.
O fazendeiro não ligava. Só tinha uma idéia na cabeça. Queria que a filha se casasse com o filho do dono da fazenda vizinha.
– Já imaginou? pensava ele, fazendo as contas. – Os dois casam, têm filhos e assim nossa família vai ficar muito mais rica e mandar em toda a região.
E tanto falou, tanto disse, tanto insistiu. Que a moça aceitou.
A vida para ela não tinha mais graça. Coco Verde tinha ido embora com outra. O resto para ela não interessava.
E foi assim, indiferente, que a moça aceitou se casar com o filho do vizinho.
Radiante, o fazendeiro mandou preparar uma festa de arromba.
Foi quando Coco Verde voltou.
Cheio de dor e de raiva, o moço sentiu que precisava falar com Melancia de qualquer jeito. Sabia que se aparecesse na fazenda podia até ser morto. Pensou e pensou muito. No fim, chamou um amigo seu, um violeiro. Os dois combinaram um plano.
No dia do casamento, no meio da festa, a casa do fazendeiro cheia de gente, parentes, amigos e convidados, apareceu um homem à cavalo. Disse que era um violeiro. Queria cantar em homenagem aos noivos. Todo mundo gostou da ideia.
As pessoas puxaram cadeiras e foram sentando. O violeiro afinou a viola e começou:
Dá licença, minha gente
Vim aqui só pra cantar
Por favor, preste atenção,
Peço para me escutar
Eu cheguei de muito longe
Prá tocar nessa festança
Trouxe o peito carregado
De certeza e de esperança
Atravessei o sertão
Comi pedra e pó na estrada
Subi morro, cortei mato
Levou tempo a caminhada
Mas uma coisa eu garanto
Isso de qualquer maneira
Prometo que vou contar
Uma história verdadeira
Não se trata de mentira
Fantasia ou ficção
Vou falar da vida mesmo
Não tem nada de invenção
Era uma vez uma moça
Que gostava de um rapaz
Sem ele, ela não vivia
Sem ele, não tinha paz
Também pro moço a tal moça
Era a prenda mais querida
Era pedra preciosa
Era a luz da sua vida
Ia tudo muito bem
Mas o destino é cruel
Às vezes transforma em lama
O que podia ser céu
Acontece minha gente
Que o pai da moça era rico
Não gostava do rapaz
Nem daquele namorico
Queria que ela casasse
Com filho de fazendeiro
Gente rica, poderosa
Bolso cheio de dinheiro
E o pai da moça deu ordem
Proibiu o tal namoro
Prá ele uma coisa assim
Era até um desaforo
Então os dois começaram
A namorar escondido
Ninguém por ali sabia
Daquele amor proibido
E o tal amor que era grande
Ficou maior, foi mais fundo
Parecia minha gente
O amor maior do mundo!
Prá ninguém desconfiar
Os dois criaram um segredo
Bolaram dois apelidos
Debaixo do arvoredo
Coco Verde e Melancia
Assim os dois se chamavam
Assim os dois se queriam
Assim os dois se adoravam
Vai um dia, o pai descobre
O tal namoro escondido
Ficou bravo, furioso
Ficou tão aborrecido
Que não quis saber de nada
Sem pensar no que fazia
Mandou a filha pra longe
Pra morar com sua tia
E de maldade, o safado,
Espalhou pela cidade
Que a onça tinha atacado
Que a filha tinha morrido
Ao saber do acontecido
Coco Verde enlouqueceu
Pensou em tomar veneno
Por pouco quase morreu
Depois partiu pelo mundo
Foi procurar sua sorte
Foi lutar pra ser feliz
Não quis mais pensar na morte!
Assim que o moço foi embora
O pai da moça depressa
Chamou a moça de volta
Disse: filha, escuta essa!
Inventou que aquele moço
Tinha pegado outra estrada
Tinha partido contente
Ele e outra namorada
A menina ficou triste
Foi pra cama, adoeceu
Não queria mais viver
Por um triz que não morreu.
Depois como estava só
Achou que era o momento
De escutar o seu pai
E aceitar o casamento
O noivo era seu vizinho
O filho do fazendeiro
O pai da moça queria
O moço tinha dinheiro!
E foi assim acertada
Uma festa pro casório
Teve missa, teve dança
Teve muito foguetório
Mas no meio da festança
Apareceu um cantor
Tinha ele uma mensagem
De certeza e de esperança
Falou de um tal Coco Verde
Falou de uma Melancia
Falou do amor que queimava
Dia e noite, noite e dia
Falou depois de um encontro
Debaixo de um arvoredo
Falou que era importante
Falou que era segredo
Explicou que Coco Verde
Precisava ver de novo
Conversar com Melancia
E foi assim oh meu povo!
Ouvindo aquela mensagem
Melancia sem ter medo
Largou a festa no meio
Foi até o arvoredo
Coco Verde e Melancia
Cara a cara, frente a frente
Foi uma coisa bonita
Foi loucura minha gente
Os dois falaram da vida
Discutiram mil assuntos
Depois fizeram um acordo:
Decidiram ficar juntos
Vou concluir essa história
Dizendo o que está na cara:
Quando o amor é verdadeiro
Esse amor ninguém separa!
Os convidados aplaudiram de pé. Acharam a história muito bonita. O fazendeiro ficou desconfiado. Seria coincidência? Sentiu que ali tinha coisa.
Ninguém percebeu, mas, no meio da cantoria, a noiva desapareceu.
Montada num cavalo, vestido de noiva e tudo, a moça foi galopando até o arvoredo.
Ali Coco Verde e Melancia se abraçaram, choraram e se beijaram.
Ali Coco verde e Melancia mataram a saudade.
Ali Coco Verde e Melancia tomaram uma decisão.
Já estava todo mundo preocupado, quando a filha do fazendeiro apareceu e pediu a palavra. Disse que queria falar com todo o mundo. Era importante. Tinha uma dúvida terrível. Precisava fazer uma pergunta. Era questão de vida ou morte.
O pai fez cara feia.
O noivo estranhou:
– Questão de vida ou morte?
A filha do fazendeiro disse que sim. Contou uma longa história. Quando era pequena tinha ganhado de presente uma caixinha de veludo. Dentro dela, disse, tinha guardado bem guardadas, as suas jóias mais raras, seus segredos mais bonitos, seus sonhos mais preciosos.
Os convidados escutavam sem compreender o que estava acontecendo.
O noivo prestava atenção.
O fazendeiro coçava o queixo.
A moça continuou. Contou que certo dia, infelizmente, por azar, a chave da caixinha de veludo desapareceu. Disse que ficou desesperada. Disse que virou a casa de cabeça para baixo. Disse que não sabia o que fazer. Que até sentiu vontade de morrer. No fim, continuou ela, desanimada, acabou mandando fazer outra chave que fosse capaz de abrir a caixinha de veludo.
A moça sorriu. Contou que mal a chave nova ficou pronta, foi passear e, de surpresa, debaixo de um arvoredo, inesperadamente, encontrou, assim, sem querer, caída no chão, a chave velha.
E a moça falou mais alto:
– Gente! Preste atenção! Minha dúvida é essa! Quero e preciso da opinião de todos. O que é que eu faço? Que chave eu uso agora? A nova que acabei de mandar fazer e nem usei ainda, ou a velha, a primeira, a antiga, a original?
Os convidados caíram na risada.
– Que bobagem! exclamou o noivo.– Que dúvida mais sem pé nem cabeça! A solução do problema é muito simples: o melhor é ficar com a chave velha mesmo!
– É claro! concordou o pai. – Também acho! O lógico, o mais certo, é ficar com a chave velha.
– Afinal ela veio junto com a caixa de veludo, acrescentou alguém.
Todo mundo concordava.
A moça deu três pulos de alegria.
Foi sorrindo e falando ao mesmo tempo.
Contou de Coco Verde. Contou de seu amor antigo. Contou das mentiras de seu pai. Chorou. Contou que passou por um período de grande sofrimento. Pediu desculpas ao filho do fazendeiro. Disse que foi enganada pelo pai. Confessou que seu grande amor era mesmo Coco Verde.
O fazendeiro ficou furioso, mas dessa vez não teve jeito.
Ali mesmo, o padre desmanchou o primeiro casamento e casou Coco Verde e Melancia.
Quem foi à segunda festa
Aproveitou muito mais
A primeira foi bonita
Mas a outra foi demais!
Coco verde e melancia
(versão do livro “Cultura da Terra”, Moderna, 2008)
Era um guri muito pobre. Morava fora da cidade, num casebre caindo aos pedaços. Mesmo assim vivia com um sorriso bonito nos lábios. Tudo por causa de uma colega de escola.
Foi assim. No começo, os dois só se olharam. Depois, puxaram assunto, sorriram, conversaram e ficaram amigos. Não demorou muito, já estavam namorando firme.
O pai da guria era cheio de dinheiro, dono da maior estância da região. O tal estancieiro tinha poder, terras, gado e muitas plantações. Tinha também um sonho: ver sua filha única casada com um primo. Como o rapaz era fazendeiro, o pai da moça fazia os cálculos. Aquele casamento faria seu poder ficar maior ainda.
O tempo passou. O menino pobre cresceu e virou soldado. Continuou namorando a filha do estancieiro e gostando cada vez mais dela.
–– Tu não devias namorar esse soldado –– dizia o pai da moça. –– É um chinelão pé-rapado. Não tem nem onde cair morto. Não tem um pau pra matar um gato!
O pai falava, falava e falava, mas, enquanto isso, o amor da moça crescia, crescia e crescia cada vez mais forte e verdadeiro.
Quando foi um dia, o moço foi convocado para lutar numa guerra.
A namorada chorou cheia de susto:
–– Fica! –– implorou ela.
O estancieiro sorriu cheio de raiva:
–– Tomara que morra!
Antes de viajar, o soldado chamou a moça.
Garantiu que ia voltar e disse mais. Pediu a ela que prestasse atenção. Contou que tinha inventado dois apelidos. Era um segredo. Ela passaria a ser Melancia. Ele seria Coco Verde.
–– Só nós dois sabemos –– explicou ele. –– É feito uma senha. No caso de qualquer recado, carta, bilhete ou aviso urgente, a gente usa os apelidos. Assim, nem teu pai nem ninguém vai saber que é coisa nossa.
Tudo combinado, o moço beijou a moça e partiu a galope.
Mas o tempo é cavalo que ninguém segura nem monta.
O estancieiro inventou uma história. Mentiu. Disse que tinha recebido notícia fresca da guerra. O tal moço, o tal soldado pobretão, o namorado da filha, infelizmente tinha morrido em combate.
No começo, a moça não conseguiu acreditar. Depois, ficou quase doida de desespero. O estancieiro abraçou a filha e, fingido, aconselhou:
–– A vida é assim mesmo. É duro, mas não faz mal. O jeito agora é tu te casares com teu primo.
E nem esperou resposta. Já foi dando ordem para chamar o padre, preparar a papelada e avisar a parentalha. Mandou também preparar a doçaria e colocar os frangos, porcos, ovelhas e bezerros na engorda.
–– Vai ser a maior churrascada que já se viu!
Acontece que notícia às vezes anda mais depressa que pensamento.
O moço soldado tinha um amigo. Um índio.
Assim que soube do casamento, o índio pegou o cavalo e partiu para a guerra. Queria que o amigo soubesse daquele matrimônio inesperado.
Encontrou o soldado acampado na beira de um rio.
Ao saber do acontecido, o jovem ficou revoltado. Gritou:
–– Largo essa guerra no meio! Quero saber se a moça mudou de ideia ou se é coisa do pai dela!
Mas o destino é cheio de truques.
Um cavaleiro apareceu galopando. Trazia ordem importante. Parte da tropa havia caído numa emboscada. O grupo estava cercado pelo inimigo. Segundo o recém-chegado, era preciso ajudar senão muita gente ia morrer.
O soldado que namorava a filha do estancieiro ficou sem saber o que fazer. Lutar para ganhar a guerra ou lutar para não perder seu amor?
–– São meus companheiros –– explicou ele ao amigo. –– Preciso ficar mais um pouco!
Mas agarrou o índio pelo ombro. Pediu a ele que montasse e voltasse para a estância. Que viajasse dia e noite sem descanso. Que, por favor, desse um jeito de chegar antes do casamento.
–– Amigo, é preciso que tu procures a filha do estancieiro!
E revelou o segredo dos apelidos. Pediu ao índio que chegasse perto da moça e, em voz alta, falasse em Melancia e Coco Verde. Explicou que era uma senha. Que ele desse um jeito de contar a ela que seu namorado ainda estava vivo e voltaria assim que pudesse.
Os dois amigos se abraçaram. O índio saltou no cavalo e partiu em disparada. Dizem que cavalgou sem parar três dias e três noites. Chegou no quarto dia de manhã, dia da festa de casamento.
Encontrou a estância enfeitada, convidados circulando, fogos pipocando, a cachorrada latindo, gaita tocando alto e cheiro bom de carne assando.
Uma reunião de família acontecia na sala. Estavam lá a noiva e o noivo, o estancieiro e sua mulher, o padre, parentes e amigos, todos conversando e tomando chimarrão.
O índio entrou de mansinho e pediu a palavra. Puxou uma viola e cantou:
Essa vida é uma guerra
É melhor tomar cuidado,
Melancia, Coco Verde
Tá mandando o seu recado!
Todos aplaudiram os versos do índio.
A noiva franziu a testa.
O índio continuou:
Para ter felicidade
É preciso ter coragem,
Melancia, Coco Verde
Volta logo da viagem!
Ninguém entendia direito os versos do índio. O estancieiro coçou o queixo. A noiva ficou pensando. Enquanto isso, todo mundo aplaudiu, pois o amigo do soldado cantava bem. E ele foi adiante:
Essa vida é uma beleza
Quem duvida se enganou
Coco Verde vem de longe
Pra buscar o seu amor!
Foi quando a noiva compreendeu o recado e arregalou os olhos. Depois soltou um grito e caiu desfalecida no chão da sala.
O susto foi geral. A festa parou no meio. Mandaram chamar um médico. O homem fez o que pôde, mas nada de descobrir um jeito de fazer a moça voltar a si. É que foi desmaio fingido.
No fim daquela mesma tarde o soldado que namorava a filha do estancieiro voltou da guerra. Era o remédio que a moça mais precisava. Ao escutar a voz do amado, a moça curou na hora, pulou da cama e chamou todo mundo. Agora estava cheia de saúde. E furiosa. Acusou o pai de mentiroso. Contou que a fizera pensar que o namorado tinha morrido na guerra. Pediu desculpas ao primo e garantiu:
–– Não tem jeito. É do soldado que eu gosto. É ele que eu quero. É só com ele que eu caso!
Depois, abraçou e beijou o namorado na frente do pai, da mãe, do noivo, de Deus e todo o mundo.
Como a festa já estava armada, tinha padre, tinha convidado, tinha chimarrão, carne, vinho e tudo, o casamento foi realizado.
Dizem que Melancia e Coco Verde foram felizes de verdade.
🖼️ Desenho de “Cultura da Terra”, Moderna, 2008.
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